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Além do crime e castigo: tentativas de superação

Jean Améry
160 páginas
ISBN: 9788578660802
Tradução: Marijane Lisboa
R$ 68,00  R$ 40,80

Em janeiro de 1945, com a aproximação das tropas soviéticas, o Exército alemão decide evacuar o campo de concentração de Auschwitz. Já terrivelmente debilitados, os prisioneiros saem em marcha forçada, escoltados pelas SS, que fuzilam em campo aberto os que perdem as forças para continuar. A "marcha da morte", como ficou conhecida, passa por Gleiwitz, dirige-se para Buchenwald e, finalmente, chega a Bergen-Belsen no início de março.


    Dos 25.437 prisioneiros belgas que iniciaram a jornada, somente 615 estavam vivos em 15 de abril, quando o Exército inglês os localizou e os libertou. Jean Améry estava entre eles. Pesava 45 quilos. Havia passado 642 dias em campos de concentração.


    Na verdade, não era belga, mas austríaco. Não se chamava Jean Améry, mas Hans Maier. Era judeu, mas de uma família convertida ao catolicismo e perfeitamente assimilada aos costumes da região do Tirol. Estava em fuga desde 1938, quando as tropas alemãs ocuparam Viena sob aclamação popular. Encontrou refúgio temporário na Bélgica, onde adotou o novo nome, que nunca mais abandonaria. Em 1940, quando esse país também foi ocupado, aderiu à Resistência, o que o levou às experiências extremas da prisão, da tortura e de Auschwitz.


    Com o fim da guerra, Améry se torna jornalista e escritor, mas espera quase vinte anos para preparar os ensaios autobiográficos que compõem este livro. Eles não seguem nenhuma cronologia, não descem a muitos detalhes, prendem-se ao essencial. São, antes de tudo, uma longa reflexão sobre raízes e desenraizamento, sobre dores e ressentimentos, sobre o papel dos intelectuais, sobre a natureza do nazismo, sobre a tortura, sobre a condição judaica e, talvez mais do que tudo, sobre a vitória da hipocrisia: com o início da Guerra Fria, os crimes nazistas passam a segundo plano por causa do papel estratégico da Alemanha na nova geopolítica mundial. Todos têm pressa de "superar" o passado, sem extrair plenamente as suas lições: "O tempo consumou sua obra. Em silêncio. A geração dos exterminadores, dos construtores das câmaras de gás, dos generais sempre dispostos a assinar qualquer coisa e devotados de corpo e alma ao seu Führer, essa geração envelhece com dignidade."


    Améry denuncia isso. Reivindica um papel positivo para o ressentimento: o dedo acusador era necessário para que os alemães compreendessem que sua conivência com o Terceiro Reich fora a negação completa de suas melhores tradições. Escrita na contramão do espírito da época, a vigorosa reflexão de Jean Améry revive, fortalecida, sempre que se discute o que fazer com as heranças das barbáries.


            César Benjamin


"Em Auschwitz, o homem espiritual estava isolado, completamente abandonado a si mesmo. Assim, o problema do confronto entre o espírito e o horror se manifestava de modo mais radical e, se me permitem a expressão, em uma forma mais pura. [...] O pensamento analítico-racional no campo de concentração, além de não servir para nada, conduzia, ao contrário, a uma trágica dialética de autodestruição. O homem de espírito tinha muito mais dificuldade em aceitar a inacreditável situação em que estava. O hábito de questionar o cotidiano, adquirido ao longo de muitos anos de treinamento, o impedia de adequar-se à realidade do campo. [...] Devo confessar que sentia grande admiração pelos militantes políticos e os religiosos: a crueldade do real era menor quando esse real podia ser inserido em um esquema mental inalterável."


            Jean Améry

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