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CÃrculo de Viena, O
François Schmitz
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"A ‘lógica da ciênciaÂ’ [...] apresenta-se como uma nova maneira de praticar a filosofia e, ao mesmo tempo, como crÃtica radical das filosofias existentes. Os habituais problemas filosóficos aparecem agora como não significativos, pois os enunciados em que estão formulados são apenas sequências de marcas gráficas aceitáveis gramaticalmente, mas cuja análise lógica mostra que não passam de ilusão. [...] Não são problemas em nenhum sentido. Para estabelecer isso, não é necessário debruçar-se sobre as capacidades da razão humana ou sobre a natureza das coisas. Basta proceder à análise lógica da linguagem para evidenciar em que condições um enunciado pode ser dotado de sentido. [...] Na distância entre forma gramatical e forma lógica reside a possibilidade de enunciar os supostos "problemas" filosóficos. Quando se tem uma visão clara das condições que um enunciado deve preencher para ser dotado de sentido, além da simples e ilusória gramaticalidade, os pseudoproblemas desaparecem por si." François Schmitz * * * Os grandes momentos da história da filosofia estão quase sempre ligados aos do pensamento cientÃfico: o platonismo à "invenção" da matemática, o cartesianismo à "revolução" galileana, o kantismo à mecânica newtoniana. No começo do século XX, a fÃsica está em crise, com o surgimento das Teorias da Relatividade, a lógica está inteiramente renovada e os matemáticos se interrogam sobre os fundamentos de sua disciplina. Desse triplo abalo nasceu em Viena um movimento filosófico original, que se anuncia antes da Guerra de 1914, cresce nos anos 1922-1936 e se dispersa com a chegada do nazismo, para prosseguir, sob outra forma, sobretudo nos Estados Unidos. Recebeu o nome de CÃrculo de Viena por não ser possÃvel encaixá-lo em uma nÃtida rubrica em "ismo": empirismo mas "lógico", "consistente" ou até "cientÃfico", racionalismo mas "empirista", positivismo mas "lógico", realismo mas "empirista". Os participantes desse movimento eram cientistas, matemáticos, fÃsicos ou economistas que se voltaram para a filosofia, mas sem esquecer suas formações iniciais. Schlick, Carnap, Neurath, Waissmann e seus companheiros trabalharam por mais de dez anos em uma crÃtica radical da filosofia tradicional. A busca de uma teoria geral do conhecimento os levou a realizar fecundos trabalhos sobre a estrutura da linguagem e suas relações com a lógica, sempre à luz de influências pesadas: Wittgenstein, Frege, Russell e Gödel muito próximos, Husserl e Kant um pouco afastados. A obra deles é estudada até hoje, principalmente nos paÃses anglo-saxões. Praticamente não há literatura no Brasil sobre eles. É a lacuna que o grande livro de François Schmidt vem preencher. Ele procura restituir toda a complexidade das doutrinas do CÃrculo de Viena, situando-as em uma perspectiva histórica e entrando nos detalhes técnicos, os únicos que permitem avaliar o alcance exato que elas tiveram. César Benjamin |